|
Pesquisadora conta que a questão escravagista da cidade foi algo que chamou muito sua atenção |
Marcela Bettega é pesquisadora e vem dialogando a questão da
preservação do patrimônio histórico de Paranaguá. Para preservar é preciso
conhecer e é isso que ela vem fazendo. Ao chegar a Paranaguá no ano de 2012, ficou encantada e perplexa ao mesmo
tempo, e passou a pesquisar sobre a cidade.
E Paranaguá lhe rendeu uma especialização em Gestão Pública
e o mestrado em Desenvolvimento Territorial Sustentável.
Mas o estopim para Marcela mergulhar na questão patrimonial
foi uma pergunta feita por uma professora do Rio de Janeiro que visitava a
cidade. Ela citou a semelhança com Paraty e perguntou: - “Quando essa cidade
deixou de ser amada?”
Conheça mais sobre ela:
Como surgiu o interesse pelo patrimônio histórico em sua
vida?
Gosto de cidades. Desde muito garota tenho o hábito de
caminhar muito, observando os caminhos. Tenho formação em Artes Visuais e
muitas práticas durante a faculdade foram realizadas tendo a cidade como
“inspiração”. Gosto muito de arquitetura.
Penso que meu gosto se modela por aí.
A vivência em Paranaguá me fez querer entender sua
configuração e história. Quando cheguei em 2012, fiquei encantada e também
perplexa com o lugar – tem porto, tem rio, tem mar, tem ilha, tem edificações
de 300 anos, tem muitos exemplares arquitetônicos antigos... tanta, tanta
coisa... que fui estudando, pesquisando...
Sou estudiosa e gosto de saber. E estudar Paranaguá me
rendeu uma especialização em Gestão Pública e o mestrado em Desenvolvimento
Territorial Sustentável.
Mas o estopim pra eu mergulhar na questão patrimonial foi
uma pergunta feita por uma professora do Rio de Janeiro que visitava a cidade.
Passeávamos pelo Centro Histórico em um domingo à tarde e depois dela tecer
muitos elogios ao Centro, e falar da semelhança com Paraty, virou-se para mim e
perguntou: - “Quando essa cidade deixou de ser amada?”
Contei essa história muitas vezes... É uma pergunta muito
forte e a partir dela construí um trabalho, que nasceu como proposta de uma
estética para os abandonos.
O que fazer com tantas edificações em estado de abandono?
Como isso pode se transformar em algo potente? Que seja possível criar diálogos,
pensamentos, reflexões?
Há dois anos você vem realizando oficinas de educação
patrimonial. Os objetivos estão surtindo efeitos ou isso é a longo prazo?
Ando muito satisfeita e orgulhosa em relação a isso!
Primeiro, por causa dos produtos gerados com as oficinas:
foram cinco artigos publicados no jornal Folha do Litoral sobre lugares
do Centro Histórico; foi realizada uma exposição fotográfica e o meu
xodó: que são os cartões-postais que foram feitos a partir das fotos da
exposição. Foram 1000 jogos de postais que estão apresentando Paranaguá a
partir de um olhar diferenciado.
Além das oficinas, algumas ações acontecem “por contato”,
como o lindíssimo trabalho do Giovanni Negromonte – Desabandonar – que é uma
intervenção artística em algumas edificações do Centro histórico, que está
trazendo na prática, reflexões muito pertinentes e pontuais sobre o espaço
urbano e a nossa relação com ele.
Como pesquisadora quais foram as descobertas que mais te
chamaram atenção em Paranaguá.
A questão escravagista da cidade foi algo que me chamou
muita atenção, são poucos os documentos que explicitam isso, mas é possível
montar um quebra-cabeças.
Ultimamente você tem participado do projeto cultura na
rede. Fale um pouco sobre esse trabalho.
Realizei dois trabalhos, um sobre as “Construções Religiosas
do Centro Histórico” e outro sobre as “Fachadas”. São mini-documentários-aulas
sobre detalhes do Centro Histórico. Batizei o trabalho de “Paranaguá a pé” por
serem trajetos relativamente curtos, passíveis de realizar em uma leve
caminhada. O Centro Histórico é tão rico, tem tantas informações impressas nas
suas formas que vale a pena dedicar um pouco da atenção para o olhar ao redor.
Ambos os vídeos estão com muitas visualizações, o que mostra
a relevância do tema para as pessoas.
Qual é a visão do Parnaguara em relação ao patrimônio
histórico da cidade. Seria possível caracterizar isso?
Sabe, nesses anos percebi que são muitas visões! Tem aquelas
pessoas que com uma visão romantizada e idealizada sobre o patrimônio
histórico, com uma expectativa saudosista que Paranaguá “volte a ser como
era”. E essa visão, inevitavelmente, leva à frustração. Não existe a
possibilidade de voltar a ser, porque se todos os edifícios forem
reconstruídos, não viveremos mais numa cidade real, e sim numa alegoria de uma
cidade antiga, num cenário. O que para alguns segmentos econômicos pode ser
bom, mas tenho lá minhas dúvidas de quanto seja bom para as pessoas.
Tem muita, mas muita gente mesmo que nem sabe sobre o
patrimônio histórico da cidade, principalmente quem vive em bairros
periféricos, que pouco ou raramente vem ao Centro.
Muitos não católicos nunca entraram nas Igrejas de São
Benedito e da Ordem que são edificações do estilo colonial/barroco brasileiro,
por exemplo – por conta da profissão de fé, e acabam perdendo uma vivência
histórica que está para além desta ou daquela religião.
O patrimônio Parnaguara ainda não é acessível para
todas as pessoas.
Tem muito trabalho a ser feito, e penso que o trabalho da
educação patrimonial seja exatamente esse de arejar as percepções em torno do
patrimônio de modo que ele possa ser integrado com a vida das pessoas no
presente.
http://christianbarbosa.blogspot.com/2019/05/oficina-de-educacao-patrimonial-da.html?m=0
Fotos: Almir Silvério
Contato:
(41) 99103-5009